Carta Aberta IPI 2023

2023-04-12T08:21:49+00:00 Abril 11th, 2023|Noticias, Notícias destaque|

Carta Aberta

Sobre a situação da Intervenção Precoce na Infância

As entidades abaixo assinadas, tendo reunido no passado dia 2 de março de 2023, para analisarem o momento vivido pela Intervenção Precoce na Infância aprovaram a presente CARTA ABERTA a enviar a todas as entidades e organizações envolvidas no Sistema Nacional de Intervenção Precoce (SNIPI) e dar conhecimento público da mesma através da comunicação social.

As evidências científicas mostram que a primeira infância é um momento fundamental para o desenvolvimento cerebral do individuo. Nos primeiros anos de vida a plasticidade cerebral potencia um desenvolvimento e aquisição de aprendizagens com maior rapidez comparativamente com idades mais tardias. É essencial investir numa intervenção adequada e o mais precoce possível para prevenir e/ou minimizar atrasos de desenvolvimento e situações de vulnerabilidade social. Assim, a privação de uma intervenção adequada no momento exato ou o prolongado tempo de espera de uma criança e família para obter essa resposta, poderão ter um impacto bastante negativo e, por vezes, irreparável no desenvolvimento da criança.

O Sistema Nacional de Intervenção Precoce é uma parceria em que participam o Ministério da Saúde, o Ministério da Educação, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e um vasto conjunto de IPSS que assinaram Acordos de Cooperação com a Segurança Social com o objetivo de disponibilizarem técnicos de diversas especialidades para constituir as Equipas Locais de Intervenção (ELI).

O SNIPI foi criado pelo Decreto-Lei nº 281/2009, e tem como objetivo assegurar o apoio atempado e de proximidade às crianças em risco de desenvolvimento devido ao ambiente familiar e social em que crescem ou devido a alguma deficiência ou perturbação do desenvolvimento.

É de realçar o reconhecimento, quer no contexto nacional quer no contexto internacional, do valor deste sistema integrado, de colaboração e responsabilidade intersectorial, como condição para se poder responder de uma forma adequada e eficaz às necessidades multifacetadas das crianças e famílias.

As organizações signatárias entendem ser seu dever cívico manifestarem publicamente a sua indignação pela degradação deste sistema que neste momento coloca em causa os direitos das crianças e das famílias mais vulneráveis.

O sistema funciona com base nas Equipas Locais de Intervenção (ELI) em que participam docentes colocados pelo Ministério da Educação, profissionais de saúde (enfermeiros e médicos) do respetivo Centro de Saúde da zona e os profissionais contratados pela IPSS com base no Acordo de Cooperação com a Segurança Social, das áreas da psicologia, serviço social e terapias.

Acontece que, regra geral, estes Acordos de Cooperação não foram revistos desde que foram celebrados na sua maioria a partir de 2010/2011, mantendo o mesmo número de profissionais em sede de acordo, números que não acompanham o aumento exponencial das crianças em acompanhamento pelo SNIPI.  Por outro lado, nem o Ministério da Educação ou o Ministério da Saúde afetaram mais profissionais de uma forma evidente, que permitisse um eficaz reforço das equipas de intervenção precoce na infância.

A situação hoje é caótica e evidenciada pelos dados de um inquérito a que responderam 50 IPSS e do qual extraímos os seguintes indicadores:

  • Nº de crianças previstas nos Acordos de Cooperação – 3.964
  • Nº de crianças que são apoiadas atualmente – 7.875
  • Diferença entre crianças prevista em acordo e apoiadas – 3.911
  • Nº de crianças em lista de espera – 919

Estes números evidenciam de forma preocupante a reduzida capacidade de resposta com que as equipas de intervenção precoce na infância atualmente se debatem.   Elevado número de crianças e famílias com necessidade de programas de intervenção precoce são deixadas para trás, ficando mesmo privadas de qualquer apoio, ou então, as condições precárias a que estão sujeitos os profissionais não lhes permitem dar uma resposta eficaz às necessidades das crianças e suas famílias, de acordo com as recomendações para a IPI baseada nas evidências científicas.

Daqui decorrem imensos problemas:

  • Para as crianças, que são privadas de apoio numa fase decisiva da sua vida;
  • Para os profissionais que são confrontados com a questão ética de terem de escolher entre as crianças que apoiam ou não apoiam e que são obrigados a providenciarem apoios que sabem que são insuficientes/inadequados;
  • Para as IPSS a frustração de estarem envolvidas num serviço que não está a funcionar adequadamente e no qual têm o dever de zelar por uma resposta de qualidade;
  • Para as famílias que se veem obrigadas a recorrer a apoios no setor privado, muitas vezes pouco adequados para crianças nas primeiras idades;
  • Para o Estado, há um custo acrescido pois financia estes apoios no setor privado através de subsídios de educação especial em processos que escapam a qualquer supervisão dos serviços de saúde ou da educação.

Numa altura em que se destaca a estratégia para a defesa dos direitos das crianças, nomeadamente com a Garantia Europeia para a infância, onde se prevê a valorização dos primeiros anos, o que vemos na prática, no âmbito da Intervenção Precoce na Infância no nosso país, é uma estratégia (ou falta dela) que, deliberadamente ou por inépcia, está a criar inequivocamente uma situação que coloca em causa os direitos das crianças mais vulneráveis.

Daqui deixamos o nosso apelo para que o nosso Estado passe dos discursos à prática e responda eficazmente às necessidades das crianças mais pequenas, permitindo o reforço das equipas locais de intervenção (ELI), quer pela revisão dos Acordos de Cooperação com as IPSS, quer reforçando os técnicos da área da saúde e da educação afetos.

Os 27 Signatários

Amigos dos Pequeninos, IPSS (Silves)

ANIP – Associação Nacional de Intervenção Precoce

APCG – Associação de Paralisia Cerebral de Guimarães

APCO – Associação de Paralisia Cerebral de Odemira

APCV – Associação de Paralisia Cerebral de Viseu

APCVC – Associação de Paralisia Cerebral de Viana do Castelo

APPACDM de Gaia

APPACDM de Setúbal

APPACDM do Porto

APPC – Associação do Porto de Paralisia Cerebral

Associação 2000 de Apoio ao Desenvolvimento – A2000 (Peso da Régua)

Associação NÓS (Barreiro)

ASSOL – Associação de Solidariedade Social de Lafões (Oliveira de Frades)

CEERIA – Centro de Educação Especial de Reabilitação e Interação de Alcobaça

CERCI Flor da Vida (Azambuja)

CERCICAPER (Castanheira de Pera)

CERCIESPINHO (Espinho)

CERCIFAF (Fafe)

CERCIMA (Montijo e Alcochete)

CERCIMARANTE (Amarante)

CERCIMB (Moita-Barreiro)

CERCIMOR (Montemor o Novo)

CERCISIAGO (Sines)

CERCITOP (Sintra)

CERCIZIMBRA (Sesimbra)

CERE – Centro de Ensino e Recuperação do Entroncamento

CRIB – Centro de Recuperação Infantil de Benavente